Os campos ucranianos, outrora dourados sob o sol do verão, agora contam uma história diferente. O Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA) acaba de divulgar uma previsão sombria, a Ucrânia deve registrar sua menor colheita de trigo em 13 anos. O motivo? Uma combinação implacável de terra ressecada, custos de produção insustentáveis e uma redução drástica na área cultivada.

A Ucrânia, conhecida como o “celeiro da Europa”, é um dos maiores exportadores de trigo do mundo. Qualquer oscilação em sua produção tem efeitos em cadeia , desde o preço do pão nas padarias de Lisboa até os estoques de farinha em Dacar. Desta vez, a queda estimada não é apenas um contratempo sazonal, mas um sinal de desafios mais profundos que podem reconfigurar o comércio global de grãos.
Terra árida, futuro incerto
Os agricultores ucranianos enfrentaram condições adversas no último ciclo de plantio. A seca prolongada durante o período crítico de semeadura deixou o solo rachado e improdutivo. “Plantei metade do que plantei no ano passado. Não valia a pena arriscar”, confessa Oleksandr Petrov, produtor da região de Kherson, enquanto examina um punhado de grãos minguados em sua palma.
Além do clima, a baixa rentabilidade tem desencorajado os investimentos. Com os custos de fertilizantes e combustíveis ainda elevados, resquícios da turbulência econômica pós-guerra, muitos agricultores optaram por reduzir a área cultivada ou migrar para culturas menos arriscadas. O USDA estima que a safra 2025 ficará abaixo das 18 milhões de toneladas, um número que não era visto desde 2012.
Efeitos globais em um mundo já sob pressão
A escassez ucraniana chega em um momento delicado. A demanda por trigo continua a crescer, impulsionada por populações em expansão e pela volatilidade climática em outros grandes produtores, como Rússia e Austrália. Analistas do mercado de commodities alertam que os preços podem disparar ainda neste trimestre, pressionando países dependentes de importações, como Egito e Líbano.
“Estamos diante de um cenário onde a segurança alimentar volta a ser uma preocupação urgente”, afirma Maria Kovalenko, economista especializada em agronegócio. “Se a próxima temporada não trouxer alívio, veremos governos reforçando estoques reguladores e disputando contratos de fornecimento.”
Enquanto isso, no setor de tecnologia, start-ups ucranianas tentam mitigar os danos. Empresas como AgroTech UA estão desenvolvendo sensores de umidade do solo e algoritmos de irrigação inteligente, mas a adoção em larga escala ainda é lenta. “A inovação existe, mas falta infraestrutura e financiamento para os pequenos produtores”, explica Dmytro Ivanov, CEO de uma plataforma de agricultura digital.
Para o mercado global, a lição é clara: a era de colheitas abundantes e preços estáveis pode estar com os dias contados. E, enquanto o mundo busca soluções, os campos ucranianos servem como um alerta, um lembrete de que até os celeiros mais férteis têm seus limites.